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sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Codornas


Codornas são pássaros da espécie Coturnix da família das galinhas mesmo, aqui no Brasil costuma-se criar as européias chamadas codornas italianas, cuja carne é deliciosa e ovos, comidos como aperitivo, têm fama de afrodisíacos, mas em nossos campos, principalmente no sul do país, existem-nas em estado selvagem, cobiçadas presas de caçadores destituídos de consciência ecológica. Pois é, minha Palmeira natal era cercada por campos gerais, grande parte em estado natural, nos quais as codornas encontravam o hábitat ideal para se reproduzirem sem maiores transtornos, ou seja, viviam sem serem perturbadas por ninguém ou por criações de gados que pisassem em seus ninhos. Quer dizer, essa condição ideal, embora sendo regra naquele tempo, não livrava as pobres aves das exceções que as transformavam de pássaros livres em jantar de algum palmeirense com uma arma na mão e um cachorro perdigueiro no chão. Inclusive um tio meu que era caçador afamado até que se deu conta que as aves também tinham direito à vida e deixou a caça para sempre.

Como já tive oportunidade de dizer no texto “A Cetra”, nunca matei um pássaro, não tenho na consciência o peso de ter tirado a vida de qualquer avezinha dessas que a natureza criou para voarem e embelezarem os céus ou adornarem as árvores como se fossem frutos coloridos, pulsantes e cantadores. Contudo, o mundo que queremos, ou aquele mundo utópico onde todas as coisas estão nos seus lugares, onde as relações entre os seres que nele vivem não contemplam a extinção de uns para benefício de outros, não existe, o mundo que vivemos é cruel, foge do modelo edênico. As codornas que habitavam os campos que rodeavam Palmeira tornaram-se provas da iniquidade do Homo sapiens, o qual tantas vezes se arroga produto supremo da Entidade que o criou à sua imagem e semelhança. Pobres codornas! Milhões de anos usufruindo de um ambiente em que tudo se ajustava, onde se alimentavam de sementes, frutas e insetos, acasalavam-se e criavam seus filhotes sem alterar o sutil equilíbrio natural que mantém a cadeia alimentar funcionando como uma máquina onde cada peça se ajusta com primor ao todo, sem que haja supremacia de uma sobre outra. Milhões de anos servindo de alimento a guarás e cachorros do mato, sem que isso significasse apreciável declínio de sua população, pelo contrário, a predação mantinha o plantel saudável pela seleção dos mais aptos, estes sobreviviam e deixavam descendentes. Milhões de anos que não as prepararam para a adveniência de seres brutos, ignorantes e malignos que, sem qualquer hesitação, moveram montanhas para causar-lhes males irreversíveis, os quais resultaram na sua quase extinção.

As aves e toda a complexidade biológica do ambiente dos campos conseguiram se manter em constante interação dinâmica até a chegada do Homo, daí em diante impôs-se uma transformação assaz deletéria que, de tudo que existiu, pouca coisa restou. Primeiro foram os lobos guarás e cachorros do mato caçados impiedosamente porque “comiam galinhas” dos criadores; depois foi a caça ilegal que, aliás, num primeiro momento, constituiu-se um fator de equilíbrio, porquanto a eliminação dos predadores havia permitido o crescimento populacional descontrolado das aves; em seguida surgiram no horizonte as máquinas agrícolas que destruíam o ambiente e tornavam impossível a vida das aves em vastas áreas, ainda que restassem nichos nos quais os animais poderiam reproduzir-se com certa tranquilidade; por último, de forma devastadora, vieram os agrotóxicos que envenenavam as águas, o solo, matavam os insetos que serviam de alimento às avezinhas e impediam a formação das cascas de seus ovos. Foi o fim inglório de bichos inofensivos que só queriam viver e deixar que outros vivessem.

Agora vejamos, se a jumentice humana não fosse o que é, poderiam os agricultores da região ter mantido algumas áreas intocadas de modo que as codornas tivessem onde viver. Comedoras vorazes de insetos, elas se constituiriam no fator de controle de pragas eliminando a utilização dos tais agrotóxicos que envenenaram tudo a sua volta. Se a ganância aliada à falta de visão dos humanos não se erigisse na pior característica desse primata imbecil, hoje teríamos codornas saudáveis ajudando no controle de pragas das plantações, o uso de venenos estaria diminuído ou eliminado e até caçadores inconsolados com seu desaparecimento poderiam ter as aves excedentes como alvo de suas espingardas e uma excelente alternativa culinária. A racionalidade que pode gerar um mundo melhor de se viver, onde as espécies possam ocupar seus nichos sem expulsar as demais, parece não ser um atributo dos homens, lamentavelmente. JAIR, Floripa, 16/01/11.

3 comentários:

Leonel disse...

Mais um episódio triste esse das codornas! Eliminamos as silvestres e agora criamos as importadas!
No nordeste também havia codornas selvagens...e caçadores! Não sei se ainda existem esses pássaros, mas, nos bares de Natal, nos anos 60, era um dos tira-gostos mais valorizados, e eu mesmo cheguei a provar.
Mas, na minha infância e juventude jamais consegui entender essa tesão dos garotos por matar passarinhos, que me pareciam tão frágeis e indefesos, além de inofensivos!
Em compensação, uma vez estourei a cabeça de outro garoto com uma pedrada! Não me arrependo! Tive melhor pontaria que ele!
Dá pra fazer outro livro só com essas lembranças da tua infância!
Abraços!

Luísa Nogueira disse...

Boa noite Jair. Desculpe por não ter passado aqui antes. Como sempre, seu texto nos presenteia com informações preciosas.

Concordo com todas as expressões usadas por você para designar o homo 'sapiens' (que de sábio não tem nada!). Com um pouquinho de sabedoria as espécies poderiam conviverem em paz. Será que ainda podem? Será que ainda dá para voltar no tempo? Sem destruições de matas e animais? Sem armas e venenos que matam e destroem?

Um grande abraço, amigo!

JAIRCLOPES disse...

Luiza e Leonel,
Obrigado pelos comentários os quais enriquecem o texto e estimulam o autor a escrever mais.

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